Amamentar salva vida de bebê e mãe de todas as rendas, diz estudo

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A velha ideia de que aleitamento materno traria efeito protetor apenas para crianças de famílias de classe econômica menos privilegiada foi sepultada de vez por uma série de estudos sobre o tema, coordenada pelo professor da Universidade Federal de Pelotas Cesar Victora e publicada na revista Lancet.

O trabalho, o maior já realizado sobre o tema e que teve como base a revisão de 1.300 estudos, demonstra que amamentar salva vidas de crianças, mulheres de todas as faixas sociais, e, de quebra, ajuda a economia de países, qualquer que seja o nível de desenvolvimento.

O efeito protetor não se dá apenas na primeira fase da vida. O aleitamento materno tem uma ação importante para a inteligência das crianças, previne a obesidade, sem falar no impacto positivo na saúde das mães

Cesar Victora

Dados reunidos de 153 países mostram, por exemplo, que mulheres que amamentam por períodos mais longos têm redução de 30% no risco de desenvolver câncer de ovário. Os efeitos protetores para câncer de mama também impressionam: cada dois anos de amamentação podem reduzir o risco da forma invasiva da doença em 6%.

Pelas contas dos pesquisadores, o aumento das taxas de aleitamento pode evitar por ano 800 mil mortes de crianças e de cerca de 20 mil mulheres.

O leite materno é uma substância viva, impossível de ser imitado pelo leite em pó

Cesar Victora

Os estudos indicam que o leite produzido pela mãe vai se adaptando às necessidades da criança, ao longo do tempo. “Ele é uma espécie de medicamento feito sob medida: com nutrientes, com elementos protetores contra infecções, para flora intestinal do bebê. Quando o bebê é prematuro, o leite produzido pela mãe tem uma composição específica, totalmente diferente, por exemplo, do que é produzido meses mais tarde”, completa.

O impacto positivo da amamentação sobre a inteligência do bebê já havia sido demonstrada por uma pesquisa anterior, também coordenada por Victora e pela equipe da Universidade Federal de Pelotas. Os dados mostram que crianças alimentadas com leite materno por mais tempo tiveram um aumento médio de 3 pontos no QI – algo que pode melhorar o desempenho escolar e, em consequência, a renda.

De acordo com um dos trabalhos que compõem a série agora publicada, a ausência da amamentação materna e seus consequentes estragos na capacidade cognitiva podem provocar perdas para economia calculadas em US$ 302 bilhões anuais, o equivalente a 0,49% do rendimento bruto mundial. Um das conclusões do trabalho é que para alcançar esses ganhos, há necessidade de se reforçar políticas que garantam o aleitamento materno.

A meta proposta é que todas as crianças sejam amamentadas exclusivamente por leite materno até seis meses. Embora o compromisso tenha sido firmado na década de 90, ele está longe de ser alcançado.

Autores do trabalho reforçam a necessidade de se colocar em prática uma série de ações: disseminar informações sobre benefícios do aleitamento, desenvolver ações que incentivem a prática, como ampliação do período de licenças maternidade, a criação de salas de aleitamento em ambientes de trabalho e a previsão de pausas durante a jornada, para que criança possa ser amamentada, regular a indústria de alimentos substitutos ao leite materno, restringindo a propaganda e a distribuição, por exemplo, de amostras gratuitas.

O Brasil é citado como exemplo no relatório em razão das práticas adotadas. São elogiados o sistema de banco de leite materno e a ampliação da prática de alojamento conjunto, que permite à mãe ficar próxima do bebê, o que facilita o aleitamento. As consequências dessas políticas ficam claras nas estatísticas. No período entre 1974 e 1975, uma criança brasileira recebia leite materno por um período médio entre dois e cinco meses. Entre 2006 e 2007, essa marca havia saltado para 14 meses. Entre 1996 e 2006, a média de crianças que recebiam leite materno por pelo menos um ano havia crescido 15%.

Embora avanços tenham sido muito significativos, Victora afirma ser necessário ampliar essa marca e, sobretudo, evitar que ocorra no Brasil problemas como registrados em outros países. O estudo indica haver uma tendência de que, com aumento da renda familiar haja uma migração do aleitamento materno para substitutos. Victora considera essencial, por exemplo, a realização de campanhas que incentivem a amamentação. “A regularidade dessas iniciativas foi bastante reduzida. O ideal é que elas sejam retomadas”, completou.

Victora afirma também ser essencial movimentos que garantam o aleitamento e evitem constrangimento, quando isso é realizado em espaços públicos. “A aprovação de regras, a exemplo de São Paulo, que garantem a amamentação é um ótimo instrumento”, completou.

Fonte: noticias.uol.com.br